quinta-feira, 7 de março de 2013

Melodias, lugares e sonhos.

Despretensiosamente resolvi ir a um show dessa banda, a Velotroz, e grande foi a minha surpresa: gostei pra caramba! E é tão legal isso! Adoro quando me dou a oportunidade de ouvir e ver algo novo em Salvador e comprovo que há sim artistas e propostas musicais super interessantes rolando na cidade (todo mundo deveria tentar isso de vez em quando, faz bem!). :)
Porém minha surpresa foi ainda maior com o talento e a performance de Giovani Cidreira, vocalista, violonista e um dos compositores da banda. Coincidentemente nos encontramos na 2ª fase do vestibular e pude convidá-lo pessoalmente para uma entrevista.
Foi assim que, numa tarde quente de segunda-feira, no pátio do cinema, gravador ligado, começamos...

















Iara - O que é preciso para se fazer uma boa canção?
Giovani - Pra mim, do jeito que eu fiz as músicas que considero boas, é tentar expor de verdade, e com toda a sinceridade, a impressão real das coisas, sem forçar a barra, entendeu? Porque hoje o pessoal tem feito umas coisas... Tipo assim, você tira uma foto de uma banda (não sei se meu pensamento está muito doido) ou de uma artista, e tem toda uma descrição, que ele está fazendo música baiana, uma música que resgata alguma coisa, e na verdade não é nada daquilo, entendeu? As pessoas compram mais hoje em dia conceito do que a música mesmo, e acaba sendo vazio, um negócio forçado, o cara querendo escrever sobre algo que ele não viveu... As música que eu acho que são boas sinto que foram feitas da forma mais verdadeira, de coisas que você viveu de verdade, ou que estão acontecendo com você. Então pra fazer uma música boa a 1˚ coisa é que ela tem que ser real, tem que acontecer primeiro.

Iara - Você, aos 22 anos, se considera adulto?
Giovani - Ainda não me considero, mas venho me deparando com problemas de adulto. Meus problemas antes eram outros, pra mim e pros meus amigos, mas agora as coisas estão cada vez mais sérias. Cada dia que passa existe uma cobrança maior em casa e uma cobrança que eu faço pra mim mesmo. É aquela coisa, né? Tocar a gente toca, mas eu nunca ganhei dinheiro mesmo com isso. E aí? Porque que eu estou fazendo isso? Por que eu continuo fazendo isso? É, há uma questão agora de sobrevivência, e isso deixa claro pra mim que agora as coisas são diferentes, agora estou tendo que correr atrás da minha sobrevivência.

Iara - E o "correr atrás da sobrevivência" não é ser adulto?
Giovani - Acho que é. Boa parte de ser adulto é fazer as coisas com menos segurança, né? Menos segurança financeira dos pais... Acho que a única coisa que não me deixa ser adulto é isso, porque o resto, fora o financeiro, a segurança e as coisas que você precisa fazer para sobreviver, ninguém entende muito das coisas pra falar que é adulto, ninguém sabe muito bem das coisas ao certo, se relacionar direito, por exemplo, ninguém sabe. Então todo mundo é meio besta mesmo...

Iara - O que veio primeiro: o canto ou o instrumento?
Giovani - O canto. Eu morava no interior que tem aqui na Bahia, que é Castro Alves, numa fazendo onde só morávamos eu, meu pai, minha mãe e meu irmão, num lugar totalmente deserto, numa casinha num topo de uma montanha. Eu não gostava muito de brincar com meu irmão, ele é meu irmão gêmeos, mas ele era muito mais ativo, mais pra frente, andava de bicicleta, caçava, fazia aventura, e eu não gostava dessas coisas porque tinha medo de cair, quebrar o braço, enfaixar... Aí eu ficava mais pelo mato, assim, cantando as coisas... Viajando e cantando! (risos). Minha mãe lá ouvia muito forró, Luiz gonzaga... E tinha aquele negócio do povo ir andando, bebendo, tocando e entrando nas casas, e eu ouvia aquilo tudo e ficava cantando essas músicas. E depois, com a explosão do sertanejo, veio a fase de Zezé de Camargo que eu adorava (risos). Eu ficava cantando sozinho e pensando: poxa, sou o Zezé! (risos) Então, eu já cantava. 

Iara - E já cantava bem desde criança?
Giovani - Não sei.

Iara - As pessoas reconheciam isso em você?
Giovani - Achavam engraçado. "É, esse menino leva jeito, ele vai ser num sei o quê". Eu tava sempre com um violãozinho de brinquedo na mão, mas só fui aprender a tocar violão mesmo bem depois. Inclusive quando eu vim pra Salvador eu comecei a tentar compor sem saber tocar nada, aí depois eu comecei com o violão e ficou mais fácil fazer as músicas. 

Iara - Venha cá, eu nunca fiz essa pergunta, é uma coisa que eu tenho, mas eu acho que muita gente tem disso também: você liga os lugares a certas músicas ou estilos musicais?
Giovani - Sim, claro. Quando eu ouço reggae, por exemplo, eu penso em praia, e inclusive eu faço música assim também. As últimas que fiz falam de imagens, na verdade não diz do lugar,  mas eu sinto o lugar quando eu... Entendeu? É... Descrevendo o lugar em forma de melodia, não sei, da intenção do negócio ... Mas eu gosto, eu viajo nisso. Tá entendendo o que eu estou falando? Não sei se estou sendo claro (risos). 

Iara - (risos) Então você tenta traduzir em música certos lugares, é isso?
Giovani - É, lugares até que eu não conheço, mas que eu tenho vontade de conhecer. Lugares que as pessoas vão e me contam. Tenho 2 músicas minhas que é bem isso. Uma é Ancoruma, que é uma montanha dos Andes. A imagem dela veio como uma batida pra mim. A outra é Trem de Outra Cidade. A imagem que eu tenho quando toco ela é eu indo de Salvador pra Cachoeira e vendo aqueles trilhos abandonados, o que me remete ao tempo que morei no interior e a casa de minha vó em Santo Amaro. 

Iara - A 1˚ vez eu eu vi você no palco eu pensei "esse menino nasceu artista"! (risos). Eu fiquei impressionada com a sua performance, por que eu vi que era verdadeira. A gente nota quando uma pessoa tenta ser algo no palco e quando a pessoa simplesmente é o que sente, e transparece. E então eu te pergunto se é possível descrever o que você sente quando fecha os olhos e canta? 
Giovani - Pô, é uma coisa que ninguém nunca perguntou e que é difícil responder. Eu acho que ali é a hora que eu tento dizer as coisas que não consigo dizer pra muitas pessoas, toda a minha dificuldade de me relacionar com algumas pessoas, de falar, de ir a alguns lugares, tudo o que acontece comigo, as coisas ruins, as coisas boas, fica tudo misturado quando eu estou ali no palco. E eu deixo me levar... Não sei explicar, na verdade, mas é como se fosse um sonho, entendeu? E sonhando ali posso fazer qualquer coisa, porque nada vai me fazer muito mal ou mal às pessoas. E aí de repente quando acaba eu fico pensando: poxa, será que aquilo que eu fiz foi verdade? Tipo quando a gente sonha que tá acordado, mas aí a gente acorda e percebe que estava sonhando. 

Iara - E desde a 1˚ vez no palco já foi assim?
Giovani - Desde a 1˚ vez sim! 

Iara - E você já ficou envergonhado?
Giovani - Nunca fiquei. Depende muito do meu estado. Já rolou d'eu ir pra um show em um dia que eu não estava a fim de fazer nada, queria ter ficado em casa. Aí eu fiz de qualquer jeito, queria que as músicas acabassem logo... Mas nunca senti vergonha não. É como eu te falei, é outra coisa, outra realidade. Meus amigos que estão ali no palco são outra coisa pra mim, não são só meu amigos... São outros seres (risos), não sei explicar, mas são diferentes, e eu posso fazer qualquer coisa. É o meu lugar preferido, onde eu posso gastar (risos). 

Iara - Uma paixão da adolescência.
Giovani - Discos.

Iara - Vinil?
Giovani - É, minha adolescência foi isso. Comecei a comprar discos porque sempre gostei. Eu lembro que quando era pequeno minha vó tinha uma vitrola e ouvia muito Roberto Carlos... E eu sempre quis ouvir disco, sempre gostei do som. E na minha casa a gente demorou pra se desfazer da radiola e comprar um som mais moderno. Então eu peguei ainda um restinho de ter disco em casa e colocar pra tocar. Cheguei a comprar alguns cd's, mas eu queria o disco. Aí na minha adolescência eu ficava no quarto ouvindo discos...

Iara - Fale aí aquele disco que é o seu xodó.
Giovani - Não é o melhor, nem é dos mais raro, mas é um disco que eu gosto muito, porque eu acho que ele mudou o meu jeito de escrever, e eu descobri o que se podia fazer com a voz. É o tipo da coisa que você acha impossível até que você ouça, é o Milagre dos Peixes, de Milton Nascimento. Os dois, o em estúdio e o ao vivo de 74.

Iara - Vamos pras rapidinhas então.
Giovani - Eu sou péssimo com essas rapidinhas, mas pode ser uma rapidinha demorada, né? (risos)

Iara - (risos) Preparado? Acenda seu cigarro aí primeiro... Então, um livro de cabeceira.
Giovani - A Rosa do Povo, de Drummond.

Iara - Uma imagem.
Giovani - O quintal da casa de minha mãe em Valéria, dá pra ver a BR assim ó, é bonito pra caralho! 

Iara - Ah, foi daí então que surgiu aquele trecho da sua música "tenho uma pista ao invés de um quintal"? Que legal! (risos) 
Giovani - (risos) É, justamente.

Iara - Uma conquista.
Giovani - Difícil essa pergunta. Não sei... Talvez o fato de que, mesmo com toda essa dificuldade, eu consiga estar tocando e fazendo música. Acho que é uma grande conquista. Não desistir é uma grande conquista. 

Iara - Uma sina. 
Giovani - Nascer, crescer, reproduzir e morrer, feliz (risos). 

Iara - (risos) É uma boa mesmo. Uma melodia. 
Giovani - Pode ser uma resposta grande? Uma vez eu estava com dois grandes amigos meus, Alice e Victor Bastos, e a gente começou a cantar uma música minha, só vozes. Eles não são cantores. Mas aí a gente entrou numa viagem, do nada. Estávamos às 2 horas da manhã conversando, e ela começou a cantar uma música minha, eu puxei e ele puxou, e a gente foi pra uma outra coisa, uma outra música que eu não sei que porra era aquela, mas era lindo, era realmente lindo! Eu fechei os olhos e de repente  esqueci onde estava, e achei que estava no espaço, e quando eu abri o olho vi que ela estava chorando, aí ele olhou pra mim e disse: "gente, que coisa transcendente!"(risos). E aquela melodia é a música que eu vou tentar fazer pro resto da minha vida. É a mais bonita, de uma música que eu não conheço, mas é minha, é nossa... Eu só consigo pensar nela, mas não sei cantá-la (risos). 

* Foto p&b por Caio Paiva
** Foto de show por Nathália Miranda



domingo, 8 de julho de 2012

Um bate-papo com Ronei Jorge

Todos Dizem Xis volta com uma entrevista especial, após quase 1 ano em standby. Se no começo do blog a ideia era entrevistar os mais chegados, passo agora a uma nova fase: entrevistar artistas que admiro e saber suas opiniões não só sobre a arte, mas sobre temas cotidianos e "filosóficos", desses que todos nós nos questionamos com certa frequência. Quando o procurei, Ronei foi super solícito. Entre contratempos com o cartão de memória cheio do gravador e alguns cafés, começamos o nosso bate-papo, que foi massa! Confiram o que rolou:



Iara - Você tem medo da morte?
Ronei Jorge – Pô, já começou assim né? Tenho sim, eu gosto muito do mistério das coisas, as coisas que parecem insolúveis, que a gente tenta buscar resposta e acha que está na ciência ou na religião, pra mim não tem muita importância não. Eu acho que é isso mesmo, misterioso, não está ao nosso alcance e pronto. Se tiver solução dá muito trabalho descobrir e eu não vejo sentido nessa busca. Então eu não gosto de pensar muito na morte até porque ela é inevitável, e eu acho que a vida não é bacana sempre, mas tem bons momentos, e não sei, não é nem pela questão de se a gente vai embora, ou o que é que vai acontecer, porque eu acho que não acontece nada (risos). Então respondendo mais diretamente, eu tenho medo por ser desconhecido e misterioso, mas também não fico pensando muito nisso não. Teve um momento em que eu pensei muito sobre isso e não foi muito bom.


Iara – Você acha que a gente tende a projetar nossa vida pensando um pouco nela?
Ronei Jorge – Eu tento viver muito o presente, não gosto muito de projetar carreira, filhos, casamento, relação profissional, não penso muito nisso não. Geralmente eu vou vivendo até porque as coisas têm sido surpreendentes pra mim. Se eu parei em algum momento e pensei como seria minha carreira eu acho que não era assim como está agora, e eu acho que como está agora é mais legal do que como talvez eu imaginasse que seria. Eu tenho uma relação com a música desde pequeno, não como cantor ou instrumentista, mas sempre me dediquei muito a ouvir, eu ouvia muita coisa, tenho foto tirando e botando discos, sempre foi minha paixão. Até pensei em trabalhar com jornalismo, trabalhar com música mais observando do que fazendo, mas como eu escrevia e queria muito entrar em banda, que era o meu sonho, eu pensei que a única via que eu tinha sem tocar nada era cantar, né? E no rock como você não precisa ser um grande cantor eu acabei entrando nessa. É assim que tento trabalhar com arte, mais com ideias do que com a execução em si, mas não que eu não tenha esmero na execução. Hoje minha carreia tomou outro rumo, trabalho com trilhas, com vídeo, com cinema, que é minha formação, escrevo textos... E eu nunca projetei muito isso, e foi melhor, acho mais bacana o que estou vivendo hoje, gosto mais.


Iara – Você faz música pra quê ou pra quem? Ou nenhum dos dois (risos)?
Ronei Jorge – Não sei, acho que é algo que a gente que faz música não para muito pra pensar, ou eu pelo menos não.Aconteceu algo muito interessante, eu fiz um trabalho envolvendo músicos daqui e uns alemães, via ICBA. Um dia eu os convidei pra irem lá em casa e um dos alemães disse algo que eu achei muito bacana, ele disse assim: a gente tem que parar de pensar que vai fazer o Sgt. Peppers. É verdade o que ele falou, e isso é um grande avanço na vida das pessoas, porque é uma meta nossa fazer uma grande obra, muito se pensa nisso quando está se fazendo arte, quando na verdade acho que até as grandes obras não tiveram esse significado na época e nem foram pensadas para serem assim, só se tornaram. Então é importante fazer o que você está sentindo no momento, o que você está vendo no seu meio, na sua cidade, no país que você vive, no mundo . A música é uma forma de manifestação que o artista tem pra passar alguma coisa, é um retrato do que ele está vivendo, não só intimamente, mas até o que tem observado, escutado. Pra mim é comunicação, e o diálogo com o público existe, quando você coloca sua música na rua você está conversando, né?

Iara – O que te inspira mais: o amor ou a falta dele?
Ronei Jorge - As letras indicam que é a falta, né? (risos) Eu não preciso de tristeza pra escrever não, não gosto de pensar que eu preciso estar na fossa, estar mal. Acho que o amor e a falta dão inspiração pra escrever de formas diferentes. É engraçado isso porque, por exemplo, Vidinha, uma música que eu fiz, não tinha pensado em relacionamento, eu escrevi pensando na profissão: “tenho uma vontade verdadeira de te abandonar...” que é a música quase como uma doença na sua vida e você tem que lidar com isso e “precisa aparecer dinheiro, parecer amor”, quer dizer, precisa sempre parecer que você está apaixonado por aquilo e às vezes está duro, difícil, não é paixão às vezes, é só ofício, labuta mesmo. Tem hora que o que te leva pro palco é só o trabalho, você tem que tocar, tem que viajar e nem sempre você está apaixonado por fazer isso. É ilusão achar que só vai fazer tudo o que gosta, tem as atribuições, você tem que estar na rádio, dar entrevista quando você não quer dar...




Iara – Vixe (risos)
Ronei Jorge – Aqui não é o caso (risos), eu fiquei até pensando em como falar isso, mas não ia deixar de dar esse exemplo que é super verdade. Então tem esses momentos, mas tudo bem, música é só mais uma profissão. E sobre compor, acho que a gente tem que se forçar a escrever também, é um exercício e eu me forço. No intervalo do primeiro para o segundo disco da Ladrões eu estava escrevendo muita coisa, compondo direto, depois disso foi uma seca gigante e eu fiquei morrendo de medo. Aí comecei a forçar, a escrever e procurar outros caminhos, trabalhei com outras coisas, o que foi muito bom pra voltar pra música depois. Seu ofício não pode ser baseado em sua vida unicamente, é um reflexo da sua observação, do contato com seu instrumento, com músicos, com outras pessoas, dialogando, pescando coisas que as pessoas falam, é um laboratório. É andar na rua e compor, é pegar o violão e forçar um pouquinho, sabe? Pra mim não dá pra esperar uma luz divina, mas geralmente com inspiração eu sinto que é mais legal e é aquela coisa inexplicável do começo da entrevista: o que é isso? Eu não sei. Tem música que sai na hora, como Vidinha, e tem outras que não. Ou então é massa se a pessoa tiver um trabalho onde ganha sua grana e faz música só por amor, isso pra mim é o ideal (risos).

Iara – Por que morar em Salvador?
Ronei Jorge – Suas perguntas são boas viu! Você está até me ensinando uma coisa, porque eu às vezes entrevisto lá no programa Radioca, e eu vou dizer que você criou um método muito bom. Nas suas perguntas as pessoas vão falar de sua profissão, mas não exatamente na limitação pergunta-resposta, tipo “Ah Ronei, como foi a gravação do disco?”, se fosse assim eu não estaria elocubrando tanto aqui (risos).

Iara – Massa, obrigada. Pois é, eu acho legal colocar mais contexto na pergunta, ampliar, aí a pessoa pode ir pra onde ela quiser, fica livre pra se direcionar na resposta.
Ronei Jorge – É... Bom, morar em Salvador. Vou começar de lá de trás. Eu sou daqui, meu pai trabalhava em banco e a gente viajava muito. Morei 2 anos em Recife e 3 em São Paulo. E eu fiquei com essa vontade de voltar a morar em São Paulo durante a adolescência, mas com o tempo eu fui entendendo e gostando mais de Salvador, e vendo que eu fazia bastante parte daqui. Antes eu achava que não, me perguntava o que eu tinha a ver com essa cidade e hoje eu não me imagino em outro lugar. Eu acho que sou super baiano. E foi engraçado quando eu trabalhei com o pessoal da Lunata, mais novos, com um som mais melodioso, meio Hermanos, indie, e eles me disseram que não se identificavam com a cidade, e eu disse que eles deveriam se ver aqui, porque esse tipo de som existe aqui há muito tempo.
A gente brigou muito tempo com um tipo de cidade, e isso ficou tanto em nossas cabeças que nos desvincula dela. A cidade do turismo e tal, que é legal também, mas não é só isso. Aí rolam umas coisas esquisitas, como ser entrevistado aqui e as pessoas perguntarem por que rock, quando Raul Seixas é daqui, sabe? Quando a cidade teve um monte de vanguarda, pensamentos modernos pra caramba, no cinema, com Glauber, muito à frente no tempo, um cara com uma visão muito aberta, de Vitória da Conquista. Tem isso também, a arte do interior da Bahia é muito forte. Aqui teve Soul Music com Hyldon, a base do Tropicalismo, da Bossa Nova. A gente fica viciado em criar um estigma, como se isso tudo tivesse sido um acaso e pronto. Não foi só um momento, a cidade se configurou assim, essas pessoas dialogavam e aconteceu. Então eu vejo hoje a cidade buscando de novo isso, com blogs, com sites, programas de TV, como o Mê de Música, a gente lançou a Bequadro, uma revista de música, as bandas de rock, os artistas de música brasileira. Isso tudo junto é algo pra ser olhado, percebido. Pô, na cidade estão acontecendo coisas. E eu não me mudaria daqui porque é a gente que faz a cidade. E ela está fervilhando, não só no circuito que eu frequento, mas muito mais pra lá, nas periferias, a cidade está acontecendo. Às vezes não fica no foco do que é nacional, ainda Rio e São Paulo pautam o que é forte. Tudo bem, mas a gente não pode só se pautar por eles, a gente tem que olhar pra dentro, pro Nordeste, pra também não cometer o mesmo erro que eles quando olham pra cá.

Iara – Já te compararam a algum artista?
Ronei Jorge – Fisicamente já, Renato Russo. Eu estava com Edinho andando na Avenida Paulista e um cara de rua, mendigo, olhou pra mim e cantou “é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã” (risos). Foi muito engraçado. Já vieram me perguntar o que eu achava dos direitos das músicas ficarem com a família, me falaram que era pra eu ter dito “eu morri”, (risos). Agora que minha barba cresceu já cantaram pra mim “na, na, na, não não quero mais carnaval”, do Raul. Musicalmente quando eu fiz a Ladrões, por conta da mistura de música brasileira com Rock, compararam aos Los Hermanos.

Iara – E você ficou chateado com isso?
Ronei Jorge – Não. Apesar de ser mais velho do que eles, a gente tava na mesma sintonia, todo mundo ouvindo um pouco as mesmas coisas. No início, logo quando a gente começou não tinha muita comparação não, os Hermanos não eram tão conhecidos e a gente tinha uma abordagem bem particular. A formação da Ladrões era eu, Edinho e Pedrão, que tocavam numa banda instrumental de jazz e música brasileira, e Serginho, que já tinha tocado muitos estilos diferentes. Com essa bagagem toda a gente só deslocou pro rock. No nosso 1˚ show a gente sentiu que a galera ficou espantada, mas que tinha gostado. Aí aprofundamos mais na música brasileira, engraçado que até antes, na Saci Tric, os covers eram de Walter Franco, Jorge Mautner, Caetano... Releitura de músicas nacionais, que sempre foi uma paixão minha.

Iara – Essa foi um amigo meu que sugeriu: Como foi ter Pedro Sá na produção do disco Frascos Comprimidos Compressas?
Ronei Jorge – A gente ganhou o Petrobrás de música e queríamos chamar um produtor que ainda não tínhamos trabalhado. Quem fez nossos EPs foi Gilberto Monte, nosso grande amigo, músico talentoso. Esses Eps foram muito bem recebidos nos nossos primeiros shows em São Paulo, o pessoal conhecia e gostava muito. Foi um EP que já de cara mostrava o nosso som, Gil traduziu isso bem. Nosso 1˚ disco quem fez foi Luiz Brasil e foi uma experiência maravilhosa, porque ele é um cara de música brasileira, tinha uma experiência enorme com vários artistas: Cássia Eller, Gal Costa, o próprio Caetano, pô eu vi Luiz tocando no Circuladô... e abriu novas perspectivas, aproximou mais ainda o som da música brasileira. Ele foi um parceiro incrível, aliás, todos os 3 produtores foram super parceiros. Aí pro próximo disco surgiu o nome de Pedro Sá, que já tinha feito o disco de Rubinho Jacobina e o Cê de Caetano. Na banda decidimos por ele, aí sobrou pro cantor falar com o cara, né? (risos) Chamei Pedro, mas ele estava ocupado e sugeriu outros nomes, legais também, mas eu disse que a gente queria ele. No final das contas ele topou e veio assistir um ensaio da gente. No 1˚ dia Pedro ficou mais calado, só ouvindo a gente tocar, não disse nada. No final eu dei uma carona e perguntei o que ele achou, né? Ele disse que tava ótimo, que a banda estava super pronta. Aí eu perguntei sobre metrônomo e ele disse que só na cabeça, no começo usa o metrônomo e depois larga. A gente gravou no estúdio de Tadeu, cada um em salas separadas, mas todo mundo tocando junto, menos a voz. A gente ficava no estúdio até amanhecer. Pedro veio com um técnico de som excelente, Igor, e eles dois são uma dupla não só muito profissional, mas de figuras espetaculares. Uma paciência zen dos caras, de pedir pra gravar de novo, de se ligar nos detalhes e Pedro tem uma inteligência de produção muito grande, porque deixava a gente responder no processo natural da banda. Ele entendeu rapidamente o som e com sensibilidade conseguiu, junto com Igor, chegar o mais próximo possível do nosso trabalho. Em minha opinião, esse disco traduz perfeitamente o nosso som na época.  Essa pra mim é a grande lição de um produtor, fazer render o trabalho da banda. Entender o que é esse som, que as vezes só quem tá de fora percebe. Pedro fez essa leitura com perfeição.


Iara – Hora das rapidinhas: Um hit.
Ronei Jorge – Carinhoso (risos).

Iara - Um diretor de cinema.
Ronei Jorge – Carl Dreyer, por causa do filme A Palavra. Acrescento aqui, malandramente, Billy Wylder, Polanski e Joaquim Pedro de Andrade.

Iara - Um Clichê.
Ronei Jorge – Ah, final de música com virada de bateria e prato. Eu falo com uns amigos meus que você pode fazer uma música bem ruim, mas se você terminar desse jeito já ganha, com raras exceções.

Iara – Um(a) Compositor(a).
Ronei Jorge – Um só né? Ó, mesmo que eu tente fugir... Caetano. E eu gosto muito de Chico também.

Iara – Uma droga.
Ronei Jorge – Café. Nunca fui muito afeito a drogas, não tenho nada contra, mas, sei lá, nunca tive vontade nem curiosidade assim... Bebo pouquíssimo, agora café eu gosto muito.

Iara – Projeto futuro.
Ronei Jorge – Não existe pra mim (risos). Projetos atuais são vários: uma trilha pro Grupo Dimenti; eu fiz um curta metragem com Paula Alice, atriz e dramaturga, e com Rodrigo Luna, cineasta e diretor de clipe; na música o que já está rolando, e que eu estou apaixonado e vou pro ensaio com um sorriso enorme, é esse projeto meu e de Edinho Rosa, estamos com uma banda já. Eu estou muito feliz, as canções de Edinho são lindas. E escrever pra Bequadro, essa revista de música idealizada por Jamile, minha produtora e amiga, e tem sido uma experiência incrível, muito boa mesmo.

Iara – Uma dúvida.
Ronei Jorge – Pra mim tudo é dúvida, tudo está em aberto, essa é uma grande certeza que eu tenho. Tudo está para ser feito, as possibilidades estão aí. Muito difícil dizer uma dúvida. Engraçado, aí volta àquela história da morte que você perguntou, eu não sei, não fico pensando nisso de Deus, deixa lá, sabe? (risos).


Iara - Valeu Ronei. :)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Vídeo, Macaco Bong e Ney Hugo.


Todos Dizem Xis está inaugurando um novo formato de entrevistas já sugerido por alguns dos nossos queridos amigos e leitores: vídeo! Aconteceu um pouco por improviso também, à época estava sem o meu estimado gravador e apelei para a filmadora. Parece que o resultado foi bom!

Sem canjica, sem forró e sem quadrilha, o São João esse ano foi em Sampa ao som do bom e velho rock'n roll. Quê? Isso mesmo. Na noite do dia 23 de junho lá estava eu e meu querido amigo Lucas Gats na famosa Rua Augusta, mais precisamente no Studio SP, para mais um inesquecível show de uma das melhores bandas brasileiras da atualidade, o Macaco Bong. Digo isso sem medo de ser feliz, o som dos caras é realmente de primeira! Diretamente de Cuiabá e com um ousado rock instrumental, o power trio colocou lenha na fogueira da cena Fora do Eixo, reanimando-a com várias "idades" - qualidade, criatividade, sensibilidade e por aí vai. Claro que aproveitei a oportunidade e o entrevistado da vez é o Ney Hugo, baixista do Macaco Bong. 1 horinha antes de começar o show, o Ney, super solícito, deu seu recado a partir de perguntas sobre a vida, a música e até mesmo sobre São Paulo. Agora é só apertar o play e conferir!



Obs: Sugestões são sempre bem-vindas! ;)

Imagens: Iara Canuto
Edição: João Pucci

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Já nasci perto do fim.

"Meu nome é Daniel Rebouças Carvalho, nasci em 26 de Novembro de 1982, no bairro de Brotas, lá no Iperba, aquele hospital perto do cemitério. Já nasci perto do fim." E assim começou nosso papo, numa tarde quente de sábado, lá na Aliança Francesa. Bom, Daniel é um ex colega de faculdade, e me lembro o quanto essa figura me intrigou logo na primeira semana de aulas, lá em São Lázaro, eu ainda com 17 anos. Além da história, temos em comum o gosto por música e pelo ensino, e mesmo nesse vai-e-vem que a vida é, estivemos sempre em contato nestes últimos 8 anos. Já era alguém que queria entrevistar há muito tempo, pois adoro sua eloqüência. Aproveitem um pouquinho dela aqui:

Iara – Começando por ela: tudo pela ou para a música?
Daniel – Hum... Na verdade acho que tudo para, porque pela seria tudo o que eu nunca quis na vida que é viver de música, ser instrumentista, nunca tive disciplina pra isso, apesar de ter começado a tocar com 7 anos de idade. Então tudo para. O esforço que a gente faz para manter os instrumentos, comprar coisas é mais para a alegria, ficar feliz ao ouvir música, gravar algo pessoal, mas nunca pela música, no sentido de ser músico profissional. Eu tentei uma época parar tudo que eu estava fazendo para me dedicar à banda, de 2007 a 2008, mas vi que não era a minha, não tenho essa estrutura pra música. Acho que quem vive de música tem que ter uma estrutura muito grande para aguentar a decepção, principalmente no cenário alternativo, você faz um esforço danado, investe bastante, e o reconhecimento é muito difícil, normalmente bem aquém do que você imagina, e isso cansa com o passar do tempo. Hoje eu toco só por divertimento em casa, tento compor alguma coisa, mas ter banda não penso mais não.

Iara – É divertimento ou diversão?
Daniel – Pode colocar divertimento, qualquer coisa coloca divertimento/sic pra dizer que foi invenção minha, pode colocar a culpa em mim, não me preocupo não (risos).

Iara – (risos) Ok. Perguntinha abestalhada agora: Você aderiu totalmente ao Facebook? E o Orkut era legal?
Daniel – Não, eu saí. Eu nem precisei assistir o filme “A Rede Social” pra querer sair, dizem que normalmente quem assiste o filme fica enojado com o processo de fofoca e mentira que envolveu a criação do Facebook. Eu saí há umas duas semanas porque eu estava perdendo muito tempo ali. Eu tenho um hábito na internet: olho os emails, depois um blog de fofoca e besteira pra relaxar e acessava o Facebook, e às vezes ficava procurando o que fazer lá, aí me irritei um pouco e saí. Ah, o Orkut era legal pelas comunidades, principalmente para baixar músicas, a discografia, era um serviço de utilidade pública na web (risos). Como a comunidade está sofrendo muita perseguição, não tem mais tanto arquivo disponível, acaba-se achando mais fácil em outros sites, então eu parei também com o Orkut. Deletei os dois, não tenho mais vida internáutica nenhuma, só email.

Iara – Qual é a sua melhor expressão de baianidade? Aquilo que você ouve e fala “véi, isso é baiano pra caralho!”.
Daniel – Hum, deixa eu ver... Eu acho que é “tá ligado”, ainda mais quando eu converso com gente mais jovem, sempre falo bastante. Acho que essa expressão eu só ouvi aqui. Ah, e também tem uma que eu acho que é tipicamente baiana. Toda pessoa de Salvador quando é perguntada sobre alguma coisa responde começando com a interjeição “rapaz”. Não interessa o contexto ou a pessoa com quem está falando, é sempre rapaz, vírgula, 3 pontinhos (rapaz,...). Em São Paulo é “então”, você pergunta algo e a pessoa fala “então...”, e começa a responder. E não tem nada a ver né? Rapaz de quê? Então de quê (risos)?

Iara – Essa é boa pelo contexto (estávamos falando sobre o show da Roberta Sá no TCA): Qual sua opinião sobre o boom de cantoras novas na MPB?

Daniel - Sim, eu estava falando sobre isso. Das que eu realmente gostei foram Céu, que tem um trabalho mais original, e Mariana Aydar, que eu achei bem bonito o trabalho. Roberta Sá é muito afinada, mas eu acho muito...

Iara – Monótono?
Daniel – Não, muito careta nas interpretações. Ela canta muito bem, tem um repertório bonito e tal, mas acho que falta um pouco de sal, apesar d’eu achar bom o que ela faz. A Mariana Aydar é muito boa...

Iara – Sim, todas são muito “boas” (risos).
Daniel – Ah sim, são bonitas (risos).

Iara – Mas me diga o que você acha dessa p... desse boom.
Daniel – Sim, sobre essa porra desse boom. Oh, eu acho que essas musas da MPB são referências, porque desde o começo da história da MPB a voz feminina fez parte do movimento. Nara Leão acho que representou bem essa MPB de música de apartamento, da solidão das grandes cidades, de pessoas intelectualizadas que pesquisavam sobre as raízes da música brasileira, sobre o samba etc... Uma vez eu vi Milton Moura falando sobre isso, que a MPB é um tipo de música das cidades em expansão, saindo das apresentações de cabaré e de rua mais expansivas, para uma interpretação miudinha, aquela voz sem muito alcance. Essas cantoras mantêm certo ar de intelectualidade, de resgate cultural e essa vozinha mais comedida, até por referência, mas eu gosto, acho bom. Mas Ana Carolina tá nesse boom? Eu acho ela muito talentosa, toca absurdamente, mas o repertório é muito aquela vibe de barzinho, e a interpretação dela me incomoda, não acha não?

Iara - É, pra mim ela tem cara de cantora de fundo de copo.
Daniel – É, né? (risos).

Iara – Agora vêm as coisas sérias (risos). Olha que pergunta bonita: Há paixão na sua prática de docência?

Daniel – Então, eu, atualmente, não me vejo fazendo outra coisa. Recentemente eu fui convidado a apresentar o trabalho interdisciplinar da escola, de supetão, e eu percebi que tendo um pouco de informação sobre o que está acontecendo eu consigo me comunicar com certa facilidade com um número grande de adolescentes. Eu tento ao mesmo tempo manter um ar divertido e um ar sério. Acho que minha idade atrapalha um pouco ainda, eu tenho 28 anos, e normalmente meus interlocutores têm entre 14 e 16 anos, dá pra perceber que atrapalha um pouco essa diferença pequena de idade, que tende a melhorar quando eu ficar mais velho. Eu não sei fazer outra coisa e com certeza tenho facilidade em ensinar, tenho uma intuição razoável para pensar aulas mais dinâmicas. Nesse sentido a paixão é total porque é a única coisa que sei fazer, mais do que música até. Recentemente eu vi um documentário sobre o poeta matogrossense Manuel de Barros, e ele diz “eu acho que nasci pra ser inútil, ser poeta”. Parafraseando ele, eu acho que nasci para me comunicar, para ser professor, não só de História, poderia ser de qualquer outra coisa. Agora falando um pouco da paixão: eu acho que ainda sou muito travado, muito tímido. Acho que eu poderia ser mais apaixonado e demonstrar mais isso para as pessoas, ser mais derramado, só que eu sou meio sério. Isso tem uma explicação: foi minha experiência ruim ensinando no Estado, em termos de me sentir desrespeitado e se eu não optasse pela severidade e dureza, não conseguiria dar nem um décimo do pouco de aula que eu consegui dar. E isso me deixou muito magoado, muito ferido e é algo que preciso superar.

Iara – Ah, política: a Dilma vai vingar?
Daniel – Acho que vai vingar sim. Ela tem um perfil bem de diretora sindical, de partido, meticulosa, diferente do perfil de político público, assim como Wagner. Ele é muito bom na articulação interna, mas ainda é um político de formação, sentido persona pública. Já Dilma é mais de administração. Então acho que ela será bastante útil para dar ações concretas ao Governo Federal, e acho isso bacana, e muda historicamente o perfil de presidente no Brasil. Ela é a primeira com esse perfil, porque ou eram militares ou pessoas bem públicas como Vargas, Kubitschek, Lula, e FHC que teve que sair da postura de intelectual para virar persona pública, e provavelmente falou muita coisa que se arrependeu depois. Collor nem se fala, persona pública até hoje, o jeito dele falar e tal. Eu acho que vinga! Mas eu tenho medo do PT por trás de Dilma.

Iara – De quê? De darem uma rasteira nela?
Daniel – Não, não. Pra mim o poder mais perigoso é aquele que não faz barulho. O PT de São Paulo, particularmente, está se articulando pra ter um poder na Câmara e no Senado muito forte, de base aliada, de fazer acordos complicados, então não sei o que esperar. Tenho que explicar uma coisa: Lula é mais que o PT, Dilma não. Dilma é do PT, e ela terá 4 anos para deixar essa marca além do PT, só que a história é outra, não sei se vai funcionar, mas espero que sim.

Iara – Essa agora é holística: preparando-se para o bombástico ano de 2012? (risos)

Daniel – Não, tô não. Tô! Na verdade estou um pouco sim. De 2009 pra cá comecei a perceber que tem ano na minha vida que é de colher e ano que é de plantar. Tem ano que é muito duro, trabalho muito sem ver resultado, bem difícil, como foi 2009. Já 2010 colhi muita coisa legal, passei no mestrado, comecei a ensinar no ISBA, e 2011 agora vai ser um ano de muito trabalho, então 2012 será um ano de resultados, espero.

Iara – Agora, por fim, você deveria deixar uma pergunta para o próximo entrevistado, mas Beto, o colaborador do blog, resolveu inverter isso na última entrevista, e me mandou dar uma resposta para uma pergunta que você fará agora, e a resposta foi Hakuna Matata. E aí, qual será?
Daniel – Ah, eu vi isso (risos). Ah, deixa eu pensar... O que você faz com seus problemas?

Iara - (risos).
Daniel – Mas a música é assim né (risos)? Com é? “Os seus problemas você deve esquecer...”, então, como você lida com seus problemas?

Iara – Como é que você lida com os seus (risos)? Já que ninguém vai responder essa pergunta porque já foi respondida, não é mesmo?
Daniel – Oh, se for um problema com alguém, íntimo, aí eu sou muito sagitariano, como dizem os ligados em signos, eu fico com aquilo martelando na minha cabeça, não consigo esquecer, falo sozinho pensando em como resolver, fico louco, e isso é ruim. E eu era mais covarde em dizer não para as pessoas, mas eu mudei, hoje minha cara mostra muito mais o que eu estou sentindo. Hoje eu lido de frente com os problemas da vida, como ganhar dinheiro e me livrar de projetos que não tragam tanto retorno porque eu preciso viver né? Descolar da asa da mãe, morar sozinho, comprar um carro, enfim, acho que eu lido melhor com os problemas agora.

Iara – Que bonitinho! Valeu Daniel! ;)

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Gats.


Gats, o Lucas, é o meu melhor amigo virtual de todos os tempos! :)

Me permitam ser um pouco brega, mas adoro ele mesmo, de verdade, de coração. Infelizmente só nos encontramos pessoalmente uma vez, numa viagem maluca para Floripa, com direito a cena de cinema e tudo: euzinha rolando escada abaixo, numa bar do centro, e torcendo o tornozelo em pleno verão! Um pecado. Bom, Gats quer ser escritor, e tem muito talento pra coisa - amiga coruja. Gats quis mudar de vida e foi morar na Argentina e depois em São Paulo - massa! Gats está no caminho certo, mas todos sabem que o caminho certo nem sempre é fácil. Ele tem um blog de contos - mesas e cadeiras - e escreve tudo em minúsculas. Ah, como a amizade é virtual, a entrevista foi via email, obviamente. Reiniciando o Todos Dizem Xis, lá vai:



Iara - A solidão te incomoda?


Lucas - acho que tanto incomoda quanto auxilia. no fim das contas, creio que a gente precise de equilíbrio -- uma dose igual de isolamento e sociabilidade --, só que esse equilíbrio a gente só consegue atingir depois que se conhece de uma forma mais definitiva, e se conhecer de forma definitiva exige muita conversa consigo mesmo, muita paciência e perseverança, e acima de tudo, muita paixão, aquela coisa de se ter tesão de viver e ser quem você é. é a velha máxima de se amar para poder amar e ser amado pelos outros.


bem, a solidão da cidade grande a qual tô sendo exposto agora tá me ajudando: tô passando muito mais tempo comigo mesmo, me dedicando as minhas causas, a me descobrir, a investir nos meus talentos e a desenvolver novas aptidões -- resumidamente, a saber de verdade quem eu sou pra poder sê-lo de forma transparente com as pessoas que amo e, principalmente, comigo mesmo. isso tá sendo vital, e tô me sentindo muito feliz por estar conseguindo traçar esse caminho de forma tão vivaz.


por outro lado, à medida que a gente vai se percebendo vem à tona aquela característica básica dos seres humanos: somos inerentemente sociais, não existimos exatamente enquanto elementos isolados nesse mar de gente que habita o planeta. então eu vou me bastando comigo mesmo, e nesse processo vou percebendo que preciso buscar outras paragens. é a segunda parte, buscar o tal equilíbrio de forças. eu quero muito encontrar gente com quem compartilhar coisas por aqui, conversar, sair por aí. ninguém é sozinho com aquele bom grado otimista, e agora tô saindo do casulo. aí a solidão atrapalha, e é difícil conhecer gente, e morar numa pensão e não ter exatamente um "lar" não ajuda muito no processo. não vou dizer que tá sendo fácil, mas sei que pouco a pouco as coisas vão se ajeitando nesse aspecto -- hoje mesmo fui visitar um amigo e passei a tarde conversando, jogando videogame e vendo futebol, hahaha.


Iara - A Copa foi decente?


Lucas - até que sim, eu me diverti vendo alguns jogos horrendos e fiquei feliz pela holanda na final, apesar de ter jogado aquém do que eu imaginava que poderia. gosto muito da espanha também. decente, mas nada sobrenatural.



Iara - Tá com medo de 2012?


Lucas - tô não, tô encarando naquela máxima de "o que tiver de ser, será", aproveitando pra compensar agora o tempo perdido antes, e fazendo minha parte pra não acelerar ainda mais o fim do mundo.



Iara - São Paulo: caos com oportunidades. Vale a pena?


Lucas - vale. bem, eu fiquei 1 ano em floripa buscando, sem sucesso, emprego na minha área. em sampa, 2 meses e cá estou eu numa empresa de legendagem de filmes. claro que a cidade não é uma santa milagreira, mas é inegável que oferece a maior gama de chances -- sem contar que é um laboratório que te capacita pra enfrentar qualquer outro lugar do planeta, praticamente. agora, que é caótica, é sim. a cidade não para nunca, todo mundo vive andando a mil, e é lógico que você entra no esquema, sem perceber. eu tinha a alma meio interiorana quando cheguei, aquela coisa dispersa e tranquila, e volta e meia hoje eu me percebo caminhando bem mais rápido que o habitual ou comendo quase sem mastigar pra ter tempo de pegar o metrô pro trampo. o clima de urgência te contamina fácil, e às vezes é tarefa árdua manter o controle.


o legal é que esse caos com oportunidade também se aplica a tudo aquilo que não tem a ver necessariamente com o profissional. tem tanta coisa pra se fazer a preços tão variados (inclusive a não-preços, haha) que você corre o risco de acabar fazendo nada por conta da dúvida. confesso que ainda preciso aproveitar mais a cidade, mas é impressionante como é impossível ficar parado por alguma justificativa que não seja pessoal -- por mais afastado que seja seu bairro, sempre tem alguma coisinha rolando por perto.



Iara - Já sabe em quem votar na eleições presidenciais?


Lucas - sei não, aliás, até acho que vou justificar, porque meu título ainda é de santa catarina. mas tô começando a me inteirar, só sei que no serra eu não voto.



Iara - Uma rapidinha (lá ele): 4 bandas inesquecíveis:


Lucas - Radiohead, The National, Legião Urbana e The Beatles.



Iara - Ok, última: literatura de banheiro, de cabeceira, ou de busú?


Lucas - de cabeceira, principalmente -- principalmente literatura fantástica. quase não leio revista, e adoro livros longos e que demandam certo esforço. mas no ônibus eu acabo ficando enjoado, além de preferir ver as paisagens e ouvir música e dar uma viajada na maionese, uhu!


Iara - Valeu Gats!


obs: fotos da viagem à Floripa - Dez/2007.



domingo, 25 de julho de 2010

Olá

Blog também é de lua, o pessoal que escreve nele então, nem se fala! E entrevistar dá uma trabalheira danada, ainda mais com esse cotidiano corrido e apertado, às vezes é só mais uma desculpa para encontros, conversas, apurar opiniões e compartilhar aqui. Enfim, enquanto novas entrevistas estão sendo gestadas, ressuscitei um antigo blog - É tanta coisa.. (aperte aqui para acessar) - estarei lá e cá. Mais uma opção, para os saudosos. Beijos.


Até Breve.

iara

domingo, 21 de março de 2010

Paul

Se eu tivesse que definir Gabriella para mim em uma única palavra seria "companheira". Justamente por isso foi um pouco difícil elaborar perguntas pra ela. É difícil perguntar algo pra alguém que muitas respostas você já sabe. (ou pensa que sabe.) Procurei iniciar com assuntos que realmente jamais soube, como no que ela pensa antes de dormir ou no que a faz lembrar de coisas.


Paul, como a chamo, é uma criatura jovem, porém bastante sensata. Fico sempre chocado com o fato dela ser da década de noventa... (enfim essa década deixou algo de bom, não é?) Também é uma menina viajada, do tipo que nasceu no sertão de Jacob city (também conhecida por Jacobina) e venceu as barreiras da Sulamérica e Europa. Temos muitos gostos em comum, inclusive algumas frutas.


Levei-a ao MAM sob pretexto de comunicar algo muito importante, o que a deixou tensa e curiosa. E aí comecei de repente a entrevista.


Finalmente, se eu tivesse que apagar tudo que disse antes e pudesse dizer ou desejar apenas uma coisa, diria ou desejaria, sem dúvida, que ela jamais pense em mim antes de dormir.



Gabriella - Beto, o que é isso? (...) Ah! Você vai fazer entrevista é? Que tenso... (...) Você já tá gravando? Não, né? Não vou nem falar "que indigno" porque cê vai colocar lá... (risos)


Beto – (Pergunta do último entrevistado) É melhor decretar a pena de morte no Brasil ou baixar a maioridade penal?

Gabriella - Acho que nenhum dos dois é melhor.


Beto -- Então qual o menos pior?

Gabriella -- O menos pior é diminuir a maioridade penal. Mas não concordo com nenhum dos dois, na verdade.


Beto -- Por que?

Gabriella -- Porque nenhum dos dois vai resolver o problema de violência do Brasil. No final das contas vai continuar tudo igual. Pra mudar alguma coisa só fazendo uma reforma política em coisas que vem da base: educação, alimentação, moradia, coisas do tipo, e que não acontecem no Brasil, no caso. Pena de morte ou diminuir a maioridade penal só resolveriam problemas pontuais.


Beto -- Em que você costuma pensar no momento antes de ir dormir?

Gabriella -- Depende muito do dia... Geralmente eu vou deitar e fico pensando em pessoas que passaram pela minha vida e que não ficaram muito tempo, do jeito que eu queria que ficasse. Pessoas cuja existência em minha vida foi muito efêmera. Não porque elas tenham morrido ou coisa do tipo, mas porque elas ficaram muito tempo presentes de uma forma intensa, tipo eu e você. Como se uma coisa que pudesse florescer mais tivesse se esvaído e eu penso muito nisso porque aconteceu já com várias pessoas. Penso muito nisso antes de dormir. Penso também no meu futuro... no dia de manhã... no meu tédio...


Beto -- Qual canção faz você lembrar coisas?

Gabriella -- É a única que vem no momento porque vi num filme no cinema recentemente... É Wouldn't it Be Nice do Beach Boys. É a única que vem no momento porque foi a última que vi e me lembrou coisas. Obviamente tem outras mas não tou conseguindo me lembrar agora.


Beto – O que ela te lembra?

Gabriella - Fez lembrar Taís.


Beto – Próxima pergunta: menino ou menina?

Gabriella – Minha avó não vai poder ler, né? (risos) Menina.


Beto – É mesmo? Esperava uma resposta diferente...

Gabriella – Esperava tipo, "os dois".


Beto – Tarantino, Scorsese ou Allen?

Gabriella – Tarantino. Pra falar a verdade, não conheço os três direito profundamente. Vi poucos filmes dos três, por incrível que pareça. Mas o que eu tenho visto de Tarantino ultimamente tem me deixado muito feliz e extasiada. É isso, velho. O cara é foda. Ele conseguiu despertar coisas em mim que é o tipo de coisa que busco quando estou vendo um filme.


Beto - O que há de melhor na juventude?

Gabriella – Poder fazer as coisas sem pensar muito nas consequências depois. Brincadeira. (risos) Porque sempre penso nas consequências do que vou fazer. O que há de melhor na juventude... acho que os jovens. São os jovens, se é que você me entende. (pausa de cinco segundos.) Eu respondi essa pergunta...


Beto – (risos) E o que há de pior?

Gabriella – Acho que é a ansiedade. E isso não é uma coisa só minha. Acredito que não, porque em conversas que tenho com amigos tem parecido uma coisa muito comum entre todos.


Beto – Que tipo de ansiedade?

Gabriella -- Essa de querer saber o que vem depois, querer que as coisas aconteçam muito rápido, achar que sua vida está estagnada e que você não está se movimentando muito, e você fica sempre esperando por alguma coisa que seja intensa, que te coloque pra cima.


Beto – Por que?

Gabriella -- É ruim porque se perde muito tempo pensando no que vem depois ao invés de estar pensando no agora e vivendo realmente as coisas, entendeu? É algo que acho ruim em mim e que também vejo nos meus amigos. A galera discute muito sobre.


Beto – O que você trouxe do exterior?

Gabriella – Vontade de voltar, em primeiro lugar. Coisas úteis e superficiais, como roupa...


Beto – A pergunta é mais pro sentido abstrato.

Gabriella – Eu sei. Trouxe boas lembranças, saudade, muita saudade. Tem uma coisa que ninguém sabe porque eu não falo, mas todo dia que acordo sempre penso nos dois lugares que já fui do exterior: Argentina e Portugal. E fico tentando ao máximo possível, em pequenas coisas, aproximar momentos do meu dia a esses lugares, entendeu?


Beto – Como?

Gabriella -- Uma vez falei pra Thaís que comer pão de fôrma integral com geleia me fazia lembrar a Argentina. Porque quando eu tava lá, meu café da manhã todos os dias era esse. E que toda vez que eu acordava de manhã e comia isso eu sentia uma coisinha no coração, sabe? Porque eu me sentia muito próxima daquilo. Era um momento do meu dia que eu estava meio entregue ao momento, sabe? E isso acontece até hoje com frequência. As vezes tou no ônibus também sentada na janela, fico olhando pra fora e tento imaginar as docas de Portugal que quando passava de carro eu via e achava uma coisa muito linda. E eu consigo imaginar. Eu tenho muita vontade de voltar nesse lugar.


Beto – Nas docas de qual cidade?

Gabriella – É tudo muito perto lá em Portugal. Não tenho certeza mas acho que era Lisboa. As províncias se confundem, não tenho certeza.


Beto – A pergunta pro próximo entrevistado.

Gabriella – Pô, já rolou essa. É meio clichê... O que você faria se o mundo acabasse amanhã? Já rolou essa, né?

BetoJá rolou.


Gabriella – É uma boa pergunta, sabia? Ok, vou fazer outra. O que você faria se acordasse um dia e descobriu que ganhou na loto? Pronto, já rolou essa também? (risos) Bota essa aí, Beto.

Beto – (risos) Que eu saiba não.


GabriellaNão vai rolar rapidinhas não? (risos)