quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Um Trecho da Mufa: a dica “cheque”!

Esta é uma parte, não oficial, da entrevista que a Revista Mufa fez com Gilberto Monte, diretor de música da Funceb. Aproveitem as dicas em primeira mão. ;)

(...)

Gilberto - Essa expectativa que você falou, sobre a década de 70, de que alguns músicos foram e outros poderiam ter ido, eu acho que existiu aqui logo quando eu cheguei. Por exemplo, no início da década de 90, que foi outro boom da indústria fonográfica no país, principalmente a produção de música jovem, de bandas como a Penélope, que foi pra Sony, e houve a expectativa, com um cenário de bandas daqui incríveis e era um período que a Sony, a Warner, todas essas grandes gravadoras estavam pegando bandas novas, e não foram tantas. Eu lembro da Bis ter matérias com várias bandas e dizendo que aqui em Salvador tinha um cenário muito interessante, e a coisa não vingou. Mais recentemente teve a Pitty, no cenário Rock, também estourando nacionalmente e que daí poderia ter aberto um porteira pra mais gente ter ido, o que também não aconteceu. Então são ciclos, nesse olhar pra década de 70 rapidamente vemos o exemplo da década de 90 e de 2000, onde ocorreram fenômenos parecidos. Eu acho que cada vez mais essa expectativa vai se diluir, porque de uma forma geral o mercado fonográfico não vai ter mais espaços pra grandes nomes, mas nomes com grande expressão sempre vão existir, só que dificilmente teremos bandas como o U2, R.E.M, astros globais, apenas casos mais isolados. O que a gente vai ter é muito mais gente bacana conseguindo ter visibilidade sem ter esse alto nível de projeção, e isso está correlacionado com a grana.

Paulo – Mas dos anos 70 nós esquecemos de falar de Raul e do Camisa de Vênus.

Gilberto – É, o que não foi pouca coisa não.

Iara – Teve o Mar Revolto também.

Gilberto – É. Eu não acho que a década de 70, na Bahia, tenha sido esse silêncio não. E dificuldade na área da música sempre existiu, acho que sempre vai existir, e isso não é um problema específico de Salvador, da Bahia, de São Paulo ou do Rio... Rapaz, qualquer país que eu visite tem excelentes músicos numa situação não tão ideal financeiramente, o que não corresponde à sua capacidade profissional. E tem outra coisa, muitas vezes isso acontece porque o cara é um puta músico, mas ele não é um bom profissional. Ele toca muito bem, é um bom criador, mas na hora de estar no palco não sabe se posicionar direito, não sabe se produzir, não sabe fechar um negócio, se tem um produtor que trabalha com ele e se ele não entende um pouco de produção pra bater bola com o cara, ele é facilmente trapaceado. Então muitas vezes a gente fala “fulana não deu certo, que desperdício, ou olha, aquele cara nunca foi reconhecido”, e tem apenas um olhar pra qualidade musical dele, enquanto que isso não é o único fator pra determinar o sucesso profissional. O cara tem que ser, antes de mais nada, um empreendedor musical, tem que estar muito completo nesse sentido. Então tem muita coisa boa musicalmente que se perde porque não teve habilidade de mercado, mínina, de dialogar com o dono de uma casa, de fechar um espaço. Isso não é só na música, é em qualquer área de produção do conhecimento. Até na academia, porque todo mundo fala “não, a academia ainda é o reduto”. Tudo bem, você pode ir pra lá e ser um professor de faculdade e simplesmente dar uma aula, ir pra casa e ficar no seu universo, você vai ter um salariozinho “desse” tamanho. Aí tem um outro professor que fez todas as especializações possíveis, que sempre escreve artigos, produz eventos acadêmicos, pô, isso tudo vai entrando como gratificação. Esse é um cara que sabe se posicionar dentro do meio dele, além de ter uma produção de qualidade, ele sabe fazer a cosia acontecer...

Paulo – Posicionamento político.

Gilberto – Empreendedorismo, cara. Posicionamento político e, a partir disso, empreendedorismo. O que esbarra no início da nossa conversa que é: não basta ter apenas uma boa ideia, o mais difícil é realizá-la, sacou? Por isso que a gente fala “ah, o cara nem é tão bom artista, mas se deu bem, como foi isso?”. Ó, uma coisa: é muito difícil uma artista saber falar sobre a sua criação, são poucos que conseguem. O cara que consegue fazer bem isso está a anos-luz de distância dos outros. Porque, 1°, as pessoas precisam saber que você criou, quem vai falar disso: a imprensa, e eu tenho que saber falar sobre isso que eu criei pra você poder escrever bem sobre o que eu estou fazendo, se não vira um discurso genérico, como a maioria dos releases. “minha influência é Miles Davis, Led Zeppelin...”. Essas influências são as de todo mundo, cara! Todo mundo têm as melhores influências.

Paulo – Todo mundo quis ser músico quando criança, né. (risos).

Gilberto – E esse discurso da fusão e da mistura também está em tudo, sei lá, do Fantasmão ao que tiver de mais contemporâneo na música. Então esse é um discurso meio que unificado, pasteurizado, mesmo que essa não seja a intenção. Agora, a diferença está em, vou usar uma palavra que muita gente não gosta, saber falar sobre o seu produto, aí dizem: “eu não sou produto, eu sou artista, eu não fui feito para estar numa prateleira”. Mas se você quer que consumam a sua arte e que paguem por isso, é o que eu sempre falo, a criação tem que ser feita sem “não me toques”, com total desprendimento, com o seu transbordar, e uma vez que você criou, tem que saber olhar aquilo ali e dizer o que é, saber qual público teria interesse em ouvir. Aí você começa a ter saídas de mercado.

Iara- É, isso foi um passo a passo: como fazer sucesso. (risos). Vamos lá, para a próxima pergunta (...)


Cenas do próximo capítulo (esta entrevista, versão oficial, e na íntegra) você encontra em:

http://www.mufa.com.br/Caixas_conteudos/tict_cont_3.html